Ofício Circular nº 58/2021
Bauru-SP, 04/10/2021
Assunto: Preocupação com a situação do Postalis diante da possível privatização dos Correios
Processo Referência: 009001.000053/2021-28

Excelentíssimo Senador
ACIR GURGACZ
Praça dos Três Poderes
Senado Federal Anexo 2
Ala Tancredo Neves
Gabinete 56
Brasília/DF
CEP 70165-900

Prezado(o) Senhor(a),

Estamos encaminhando esta correspondência em razão de nossa preocupação com a difícil situação dos participantes e assistidos do Postalis, que estão enfrentando cobranças de contribuições extraordinárias, no nosso entender, abusivas e que poderão ter suas situações agravadas no caso de confirmação da privatização dos Correios.

O Postalis administra dois Planos de Previdência Complementar para os empregados e ex-empregados dos Correios: o Plano BD Saldado e o Plano Postalprev.

O Plano BD é um plano de Benefício Definido instituído em 1981 com a finalidade de garantir as aposentadorias dos empregados dos Correios, sendo custeado por contribuições dos participantes e dos patrocinadores (Correios e o próprio Postalis). Importante destacar que um Plano de Benefício Definido tem, por característica, conceder benefícios calculados com base na média salarial dos últimos meses trabalhados, não havendo uma relação direta entre o valor acumulado das contribuições durante toda a fase laboral e o valor do benefício concedido.

No ano de 2008, em razão da negociação dos Correios e das representações dos empregados dos Correios, o Plano BD foi “Saldado”, sendo definido, naquela ocasião, o direito acumulado dos participantes e o direito adquirido dos assistidos do Plano, que passou a ser denominado de Plano BD Saldado.

A partir do saldamento do Plano BD, os participantes passaram a contribuir para o Plano Postalprev, constituído na modalidade de Contribuição Variável, modalidade esta em que o valor do benefício, quando da aposentadoria, é calculado com base no valor do saldo de contas individual do participante, que é formado pelas contribuições do participante, pelas contribuições do patrocinador e pela rentabilidade auferida pelos investimentos do patrimônio do Plano.

Portanto, os participantes que se encontravam filiados ao Postalis no momento do saldamento do Plano BD, passaram a estar vinculados aos dois planos de benefícios para que, no futuro, tivessem suas aposentadorias administradas pelo Postalis formadas pela soma dos seguintes benefícios:

  1. Benefício Saldado do Plano BD (direito acumulado até 2008); e
  2. Benefício Programado do Plano Postalprev (formado pelos recursos acumulados na conta individual a partir de 2008).

Importante destacar que o saldamento do Plano BD realizado em 2008 foi feito por interesse da patrocinadora Correios, com o intuito de mitigar o risco do Plano de Benefício Definido que, como já informado anteriormente, não possuia uma relação direta entre o valor acumulado das contribuições e o valor do benefício concedido, causando incertezas no custo do benefício pós-emprego da patrocinadora.

E por estar minimizando seu risco futuro, o patrocinador Correios reconheceu uma dívida, no momento do saldamento do Plano BD, referente à Reserva Técnica do Serviço Anterior (RTSA), também conhecida como Serviço Passado.

A título de esclarecimento, é comum os patrocinadores arcarem com os custos da RTSA nos Planos de Previdência, pois são encargos referentes aos empregados que já possuíam contrato de trabalho com o patrocinador no momento da constituição do Fundo de Pensão. E para esses trabalhadores, não haveria tempo hábil de contribuição para a formação dos seus benefícios. Por isso os patrocinadores usualmente assumem a responsabilidade pela RTSA, assim como foi feito pelos Correios em 2008.

Esta introdução foi importante para que V.Sa. entenda a motivação do saldamento do Plano de Benefício Definido.

A partir de agora, iremos tratar das causas de nossa grande preocupação com o futuro das finanças dos participantes e assistidos do Plano BD Saldado.

O Plano BD Saldado fechou o ano de 2020 com um déficit de R$ 7 bilhões. Considerando que desde o ano de 2014 o Plano apresenta déficits e que já estão sendo equacionados por meio de contribuições extraordinárias (déficits apurados em 2014 e em 2016), o déficit total do Plano BD Saldado atualmente monta em cerca de R$ 13 bilhões.

Sabemos que o montante expressivo de déficit possui causas atuariais e financeiras e s que as causas atuariais, tais como aumento da longevidade e redução das taxas de juros, afetam a todos os Planos de Previdência em âmbito mundial.

Mas no caso específico do Plano BD Saldado do Postalis, as variáveis financeiras do déficit são bastante relevantes e suas origens, como vamos detalhar a seguir, devem ser questionadas.

As principais causas financeiras do déficit do Plano BD Saldado são:

  1. Não pagamento da RTSA;
  2. Investimentos sob administração ou custódia do Banco BNY Mellon;
  3. Reprecificação de Ativos;
  4. Atraso na elaboração de Planos de Equacionamento nos anos de 2016 a 2019;

Recentemente foi aprovado um novo Plano de Equacionamento para o Plano BD Saldado que transfere para participantes, aposentados e pensionistas a responsabilidade pelo pagamento de valores que deveriam estar sendo pagos pelo patrocinador Correios, como é o caso da RTSA – Reserva Técnica de Serviço Anterior, dívida contratada pelos Correios no momento do saldamento do Plano e que não vem sendo paga desde 2014. O valor atualizado desta dívida é de R$ 1,7 bilhão.

O Plano de Equacionamento aprovado também transfere para participantes, aposentados e pensionistas a responsabilidade pelo pagamento dos prejuízos causados ao Plano pelos investimentos que estavam sob a administração do banco BNY Mellon. Sabemos, por meio da imprensa, que há uma negociação, ainda não concluída, para que o banco BNY Mellon aporte recursos no Plano que, de acordo com a reportagem, seria no valor de R$ 2,5 bilhões. 

Não concordamos que participantes, aposentados e pensionistas que pagaram em dia todas as suas contribuições ao Plano BD Saldado tenham que arcar com o pagamento de recursos que eram seus e foram desviados.

A Reprecificação dos ativos que compõem o patrimônio do Plano, realizada no ano de 2017 pelo então interventor, designado pela Previc, reduziu o patrimônio do Plano em cerca de R$ 1,6 bilhão, valor este que está sendo pago pelos participantes e assistidos nas suas contribuições extraordinárias.

Sabemos também que desde 2016, de acordo com a legislação vigente, havia a necessidade de realização de um Plano de Equacionamento, que não foi implantado por negligência e omissão das administrações passadas do Postalis e dos Correios. 

Esse atraso de cinco anos na implantação do Plano de Equacionamento onerou em R$ 1,9 bilhão o valor do déficit. Não podemos concordar que participantes, aposentados e pensionistas sejam responsabilizados pelo pagamento deste valor.

Todas as causas de déficits citadas acima, em valores vultosos, tiveram origem na má administração do Postalis, que durante o período de acúmulo do déficit, entre 2014 e 2020, tiveram seus dirigentes indicados pelo patrocinador Correios ou pela Previc (no caso do interventor).

O participante, que contribuiu rigorosamente em dia com suas obrigações previstas no Regulamento do Plano, não poderia ser chamado a pagar os déficits de componentes financeiros apresentados.

Mas recentemente, mais uma vez, foram chamados a pagar pelo déficit causado pela má administração dos seus próprios recursos, pois a Diretoria Executiva do Postalis elaborou e aprovou, com voto de qualidade no Conselho Deliberativo, um Plano de Equacionamento que além de instituir uma Contribuição Extraordinária de elevado valor, ainda impôs o pagamento do déficit remanescente por meio da redução de Benefícios Futuros.

Em resumo, o déficit do Plano BD Saldado passará a ser pago por meio de uma contribuição extraordinária de cerca de 18% do valor do benefício do Plano (saldado ou efetivo) e, além disso, outra parcela do déficit será paga por meio da redução do benefício de Pensão por Morte para 50% do valor do benefício do aposentado e também por meio da extinção do benefício de Pecúlio por Morte. Também foi introduzida uma alíquota diferenciada de 75% a título de Contribuição Extraordinária sobre o Abono Anual (13º benefício).

Dessa forma, solicitamos o apoio de V.Sa. na realização das seguintes ações:

  1. Identificar os devidos responsáveis pelo déficit de origem financeira do Plano BD Saldado do Postalis;
  2. Destinar o pagamento do déficit financeiro do Postalis a quem os deu causa, livrando participantes, aposentados e pensionistas de estarem pagando por danos causados por terceiros aos seus próprios patrimônios;
  3. Levar este assunto para dentro de qualquer discussão sobre possível privatização dos Correios para que fique formalizado, em documentação pertinente, toda a dívida do patrocinador Correios para com os Planos de Previdência Complementar administrados pelo Postalis;
  4. Formalizar, no âmbito do processo de privatização dos Correios, que o Plano de Previdência dos empregados dos Correios, após privatizado, deve ser mantido sob administração do Postalis;
  5. Formalizar, no âmbito do processo de privatização dos Correios, que as dívidas para cobertura de déficits dos Planos de Previdência Complementar, mesmo aquelas que vierem a ser reconhecidas judicialmente em momento futuro, serão de responsabilidade de quem vier a adquirir os Correios.

Nossa preocupação não é só com a situação presente da Previdência Complementar dos empregados e ex-empregados dos Correios.

Temos uma grande preocupação com o que pode acontecer caso se efetive a privatização dos Correios.

Além da preocupação do cumprimento de obrigações dos Correios junto ao Postalis pela empresa sucessora, temos também preocupações inerentes à própria continuidade dos planos de previdência administrados pelo Postalis.

Uma empresa privada que deseja apenas ter lucro e remunerar seus acionistas pode desejar alterar as condições previdenciárias dos empregados e ex-empregados dos Correios, deixando à deriva algumas centenas de milhares de participantes, aposentados, pensionistas e seus dependentes.

Vislumbramos alguns cenários possíveis:

Cenário I – A empresa sucessora dos Correios não desejar mais ser patrocinadora dos Planos BD Saldado e Postalprev.

Caso esse cenário aconteça, será solicitada a Retirada de Patrocínio dos Planos, quando será calculado o direito (acumulado ou adquirido) de cada participante e assistido. 

No caso do Plano BD Saldado, onde o patrimônio do Plano corresponde a aproximadamente 22% dos seus compromissos, o direito (acumulado ou adquirido) do participante é muito baixo.

Considerando que o patrocinador irá integralizar o pagamento de sua parcela do déficit no caso de uma Retirada de Patrocínio, o direito (acumulado ou adquirido) do participante e do assistido será de a aproximadamente 60% do compromisso que o plano tem com ele.

Na Retirada de Patrocínio o participante terá que fazer uma opção:

  1. Resgatar o valor equivalente ao seu direito (acumulado ou adquirido), recolhendo Imposto de Renda sobre este valor; ou
  2. Transferir o valor equivalente ao seu direito (acumulado ou adquirido) para um outro plano de previdência complementar que, pela legislação vigente, normalmente é administrado por um banco ou por uma seguradora.

Importante ressaltar que os bancos e as seguradoras, por visarem lucro e terem obrigação de remunerar seus acionistas, pagam valores de benefícios significativamente menores do que os Fundos de Pensão.

Fazem isso ao não repassar todo o rendimento auferido nos investimentos e por cobrarem taxas de administração superiores às cobradas pelos Fundos de Pensão.

Cenário II – A empresa sucessora dos Correios desejar alterar as modalidades dos Planos, que atualmente são de Benefício Definido (Plano BD Saldado) e de Contribuição Variável (Plano Postalprev), para um modelo de Plano de Contribuição Definida.

Neste cenário, o direito (acumulado ou adquirido) do participante e do assistido, com o deságio citado no “Cenário I” seria transferido para um Plano de Contribuição Definida, onde não haveria garantias da manutenção do valor do benefício e nem garantia do pagamento de benefício vitalício.

Essa falta de garantias gera grande risco dos participantes e assistidos ficarem desamparados na velhice, acarretando um grave problema social.

 

Cenário III - A empresa sucessora dos Correios querer se desvincular com o Postalis e transferir a administração dos Planos para um banco ou seguradora.

Os bancos e seguradoras que administram Planos de previdência complementar são especialistas em planos na modalidade PGBL, que nada mais são do que os Planos na modalidade de Contribuição Definida tratados no “Cenário II”.

Além disso, já mencionamos, no “Cenário I”, que os benefícios pagos por bancos e seguradoras são inferiores aos benefícios pagos pelos Fundos de Pensão.

E, ainda, caso haja transferência de administração dos Planos do Postalis para um banco ou seguradora, os participantes e assistidos perderão o seu direito de participar da gestão do seu Plano de Previdência, o que atualmente fazem por meio de assentos paritários no Conselho Deliberativo do Postalis.

Lembrando que os participantes são os donos de, pelo menos, metade dos recursos aplicados nos Planos administrados pelo Postalis, é natural que tenham o direito de participar das decisões que irão definir o seu futuro.

Portanto, em qualquer dos cenários acima vislumbrados, é certo que participantes e assistidos do Postalis terão enorme prejuízo com a privatização dos Correios.

Lembrando que esses participantes e assistidos pagaram religiosamente suas contribuições ao longo de toda a vida e merecem ter seus contratos firmados junto ao Postalis honrados mesmo que aconteça uma privatização do patrocinador Correios.

Agradecemos a atenção e colocamo-nos à disposição para dirimir dúvidas e para participar de quaisquer debates sobre este tema.

lock Assinatura(s)

Documento assinado eletronicamente por José Aparecido Gimenes Gandara, em 04/10/2021 às 12:25:08, conforme horário oficial de Brasília.

José Aparecido Gimenes Gandara - Presidente